Esse relato será um pouco confuso… Confuso por mesclar a opinião do organizador do evento e do ciclista. Tente a me ajudar a entender quem é quem durante o texto. Eu publiquei ele, originalmente, no blog da Velodrome Bike Shop. O Caetano também publicou o seu relato, acesse aqui.
O BRM 200 km Misto de São Luis do Paraitinga já está no calendário do clube Randonneurs Mogi das Cruzes a alguns anos. E sempre ostenta a alcunha de ser um dos brevets paulistas com menor números de concluintes proporcionais (em torno de 10 a 20%). A dificuldade vem da combinação de estradas de terra (razoavelmente boas) e de subidas longas e inclinadas. É um brevet que tem sempre mais do que 3500 metros de subida acumulada.
Quando o Rafael Dias me convidou para fazer parte da organização, juntamente com o Rodrigo Roux, nós entramos no momento da definição de calendário, e o que nos proporíamos a organizar para deleite dos ciclistas que gostam do estilo do Clube. Pois bem, nos propusemos ter um BRM 1000 km (que foi muito bacana para a história do clube) e também preservar o brevet misto.
Já tínhamos as rotas anteriores, e nas nossas discussões o Rafael propôs passar por um pequeno vilarejo do município de Cunha chamado Jericó (talvez até seja bairro, mas desconheço o status do logradouro).
Abrimos as inscrições, instigamos os nossos fiéis ciclistas a se desafiarem, e tivemos 18 inscritos. Um bom número, considerando o histórico e grau de dificuldade.
Na proximidade da data, muitos começaram a discussão sobre qual tipo de bicicleta, tipo de pneu, estratégia de esforço e assim vai… Na semana do brevet, São Pedro quiz fazer parte e apimentou o caminho com uma chuva leve e constante nos três dias que antecederam a largada. Com isso todos voltam a discutir tipo de bicicleta, tipo de pneu, estratégia de esforço e assim foi…
Desde abril de 2016, quando fiz um BRM 200 km no estado do Illinois nos EUA, eu quiz ter um brevet onde os organizadores largassem com todo o grupo. E combinamos que o BRM 200 km de SLP seria tal evento. E assim o fizemos…
A manhã da largada estava com temperatura fria, mas bem agradável, sem chuva e com a presença de 16 dos 18 inscritos. Cada um com sua estratégia montada e sem saber como estaria as estradas de terra (rezando para que estivessem sem barro). Falando sobre escolhas, eu resolvi ir de bike estilo gravel e com pneu mais estreito e com cravos, basicamente pedalando uma Corratec AllRoad com pneus Panaracer Gravelking SK 32 mm.
Tomamos café da manhã na Pousada Caravela, onde eu estava hospedado com a Patricia e local da largada. Distribuímos os passaportes, o Rafael fez o briefing e foi dada a largada. Eu ainda demorei mais uns 10 minutos para largar terminando de arrumar detalhes da minha bike. A Patricia largou comigo e ia acompanhar até o primeiro Ponto de Controle e depois desceria para Ubatuba, até a praia (corajosa!).
Entre SLP e PC1 eu parei para arrumar o freio do Samuel, iniciante no mundo dos brevets e que escolheu logo o misto como primeiro passo. Até o PC1 foi um bom pedal, excelente temperatura e asfalto bom. Parei no bar, tomei um café quente, comi um bolo (pedal peba?) e me despedi da Pati. Voltei pouco mais de 2 km na mesma rodovia e entrei na estrada de terra. E que fiquei impressionado como estava boa, e rolou muito bem até o PC2, em Catuçaba, com dois ou três pontos de barro e que não atrapalharam nada… Que sonho!
Parada rápida em Catuçaba para comprovar a passagem e seguimos num grupo maior até o começo do trecho mais duro. Estava eu, Abner, Caetano, Max e o Roux nos alcançou. Rapidamente chegamos ao pé da primeira subida e tivemos a real noção do que nos esperava. A chuva tinha cessado no dia anterior, o sol abriu e transformou a terra num barro pastoso, que grudava nos pneus e escorregava. Eu e o Abner peitamos a primeira subida, mais curta e íngreme, sem empurrar… Sabíamos que aquilo era só o começo…
Seguimos a subida, conseguindo pedalar, mas vendo que seria desgastante. O Abner estava atrás de mim e o Max bem próximo também. No final dessa subida, não dava mais para pedalar, tive que empurrar… Engoli seco os escorregões e patinadas e empurrei… Mas foi curto e não tirou a motivação. No final da subida esperei o Abner e alguns minutos depois o Max chegou.
As descidas estavam nas mesmas condições das subidas: escorregadias… Eu daria um outro atributo: divertidas! Caramba, como eu me diverti tendo que controlar a bike onde as duas rodas deslizavam e em trechos que era melhor não freiar (e entregar a direção para o primeiro Santo disponível). O Max, na sua estréia na terra e bom bike gravel, teve que empurrar na descida (aí sim sentiu o drama).
E assim foi, mais outra subida com barro, mas empurra bike… Alguns trechos de bloquetes. Até chegar em Jericó. Lá, peguei água na Igreja. Ainda estava bem disposto. Parei no bar da Vila para saber se tinha alguma coisa… Não fiquei nem um minuto… Cheguei no local, escutei a conversa, vi os gritos de um caboclo perguntando o preço da dose de vodka, vi um outro mostrar 5 dedos (R$5) e todos bêbados (até o dono). Achei mais prudente seguir.
Menos de um km à frente, uma parede de bloquetes, com uns 30% de inclinação, impossível de pedalar, e horrível para empurrar. Parei para comer uma goiabinha e o Abner apareceu. Foi a gota d’agua. Nesse momento eu xinguei os organizadores, sem pensar que eu estava nesse grupo.
Pelo menos o visual do final da subida valeu o esforço e sabíamos que não faltava muito para o asfalto. Com tanta lama e sujeira, as correntes rangiam, eu sentia que ia arrebentar se fizesse muita força, estralava tudo.
Cheguei no asfalto, mas quem disse que o alivio chegou? Tinha ainda uma subida de quase 3 km com inclinação entre 12 e 16%… No meio dela, eu não aguentei e empurrei, para preservar as pernas… Estava doendo muito do trecho de terra. Não via a hora de chegar em Cunha e comer.
Vencida a subida veio a descida, paramos num posto. O Abner lavou a bike e lubrificamos as correntes. Entramos na lanchonete do posto para comer, e nessa hora, por causa da pressa, eu cometi um erro grave na alimentação e hidratação. Eu só comi dois pães de queijo e bebi uma coca-cola. Deveria ter comido mais e bebido um isotônico, além de ter levado comigo.
Seguimos, e poucos quilômetros depois eu senti que não estava rendendo. Que eu bebia água e continua suando muito, percebi que estava com falta de saia e minerais.
Parei em outra lanchonete e insisti para o Abner seguir sozinho. Eu precisava de um tempo para comer e me recuperar. Foi uma decisão acertada. Tomei um Isotônico e levei outro comigo, além de comer bolo (ciclista peba?) e um providencial pão de queijo.
O tempo estava apertado e comecei a fazer contas de velocidade. Começou a anoitecer e a temperatura estava muito confortável. Após uns 15 quilômetros e mesmo me hidratando com isotônico comecei a sentir sinais de câimbras. Não consegui controlar e as pernas travaram, as duas, numa descida. Uma dor muito forte. Parei assim que pude e tentei relaxar a musculatura. Mesmo com dor, continuei pedalando devagar. Em alguns trechos mais íngremes, eu tive que empurrar para não agravar.
Mais ou menos meia hora depois tive câimbra na panturrilha, uma dor muito forte. Literalmente eu gritei! Parei… esperei o músculo relaxar… e segui. Sempre fazendo contas de ritmo. Cheguei em Lagoinha, me sentindo muito melhor, o isotônico e alimentação tinham feito efeito. Decidi não parar para conseguir chegar a tempo. Sabia que os últimos 20 quilômetros eram mais planos. Dei o máximo que pude, andando sempre acima de 30 hm/h. Eu queria muito brevetar!!! As pernas ainda fisgavam, ainda bem que deu para segurar as câimbras. Quando cheguei no acesso à São Luis de Paraitinga, eu não acreditava. Eu ainda tinha 25 minutos até o tempo de corte de 13:30h. Cheguei com o 13:15!!!!!!
Foi fantástico!!!! Um grande desafio, com alguns erros e muito feliz pela conclusão.
Esses brevets mistos são duros, esse em especial estava muito pior. Ano que vem estarei de volta!
1 Pingback